quinta-feira, 10 de abril de 2008

Decisão de Escola de Viana do Castelo

Embora datada e já ultrapassada pela burocracia ministerial, aqui fica a deliberação de mais uma Escola:

Ex. ma Senhora
Ministra da Educação


C/conhecimento:
Presidente da Assembleia da República
Primeiro Ministro
Ministra da Educação
Procurador Geral da República
Provedor da Justiça

O Conselho Pedagógico da Escola Secundária Pluricurricular de Santa Maria Maior, em Viana do Castelo, reunido a 05/03/08, aprovou, por unanimidade, o seguinte memorando que trazemos à consideração de V. Exª

1. A avaliação não é uma novidade para os Docentes.
1.1 Regemo-nos até aqui pelo modelo de avaliação instituído pelo Decreto Regulamentar nº 11/98 de 15 de Maio, o qual contemplava uma avaliação baseada na Formação Contínua e na apresentação de um Relatório Crítico; e, se na avaliação do desempenho, todos tivemos ,´Satisfaz, é porque nunca foi regulamentada a atribuição da menção qualitativa de Bom e de Muito Bom;
1.2 Possuímos licenciaturas; (alguns de nós) cursos de pós-graduação, mestrados, doutoramentos;
1.3 Fizemos estágio pedagógico; alguns de nós prestaram provas públicas para acesso ao 8º escalão;
1.4 Frequentámos/dinamizámos/realizámos acções de formação, congressos, encontros, seminários científicos;
1.5 Alguns de nós são autores de obras científico-pedagógicas (livros e/ou artigos científicos);
1.6 Temos uma profissão de grande visibilidade e amplificação – somos, diariamente, avaliados pelos nossos alunos, respectivos encarregados de educação, a comunidade em geral, os nossos colegas;
1.7 Não tememos, por isso, a avaliação. Não é de uma questão de ‘sentimentos’ que se trata. Consideramos mesmo ser a avaliação um elemento integrante do processo rigoroso de desenvolvimento educativo/ profissional.

2. O modelo de avaliação instituído pelo Decreto regulamentar 2/2008 desestabiliza as escolas
2.1 É demasiado pesado e burocrático;
2.2 Ocupa-nos tempo de mais, desvia-nos do nosso objectivo fundamental – ensinar;
2.3 Inquina as relações entre colegas - já não bastava a divisão artificial entre professores/professores titulares, produto de um concurso injusto onde a actividade docente foi desvalorizada - agora, uns são avaliadores e outros avaliandos, num processo perverso em que professores licenciados avaliarão doutorados; mais perverso ainda, os avaliadores de hoje serão avaliandos amanhã e vice-versa;
2.4 Integra paradoxalmente, no mesmo grupo de docentes para progressão na carreira, quer o professor avaliador, quer os que por si são avaliados - avaliador e avaliado são concomitantemente partícipes no mesmo processo de progressão na carreira;
2.5 Dificulta a partilha (essencial a uma didáctica aferida e devidamente generalizável) e pode ser gerador de conflitualidade e individualismo, numa profissão que se deverá pautar pelo rigor científico, mas também por um relacionamento afectivamente estável (de facto, só uma ínfima minoria poderá obter a classificação de Muito Bom ou Excelente);
2.6 Presume que avaliar alunos e colegas requer as mesmas competências, pelo que se dispensa de proporcionar formação especializada aos avaliadores;
2.7 Considera os resultados dos alunos um item a avaliar o que, já de si potencialmente perverso, cria, de novo, situações desiguais entre colegas – por exemplo, não há duas turmas iguais; há disciplinas em que é muito mais fácil ter sucesso do que noutras; nem todas as disciplinas são sujeitas a avaliação externa;
2.8 Possui itens/dimensões subjectivos de avaliação (por exemplo, a dimensão ética) e sem clarificação dos observáveis;
2.9 Num contexto estrito de avaliação de desempenho, apresenta a possibilidade de intervenção dos Encarregados de Educação (artigo 18º. 3), elementos que de forma directa detêm no processo a posição de interessados e que de forma indirecta (através dos seus educandos) recolhem e inferem os fundamentos da sua apreciação. Tal possibilidade parece-nos incongruente, dado que o artigo 12º circunscreve como avaliadores o Coordenador do Departamento Curricular e o Presidente do Conselho Executivo e é, de facto, estritamente de avaliação de desempenho do pessoal docente que trata o presente Decreto Regulamentar (cf. pp. 225, 226 e passim).

3. O Ministério da Educação iniciou o processo de forma pouco consequente e perturbando seriamente o normal funcionamento da escola.
3.1 O Decreto Regulamentar 2/2008 foi publicado a 10 de Janeiro, mas aplica-se ao presente ano lectivo, que começou em Setembro de 2007;
3.2 Não estava constituído o conselho científico para a avaliação de professores -CCAP - (Artigo 6º, 2; 21º, 3; 28º - 2), não estava regulamentada a delegação de competências (Artigo nº 12, 2), não estavam aprovadas as ponderações dos parâmetros classificativos (Artigo nº20, 2), não estavam fixadas as percentagens máximas para a atribuição das classificações de Muito bom e Excelente (Artigo 21º, 4), não estava definido o regime de avaliação dos parâmetros classificativos previstos no nº1 do artigo 45º do ECD (artigo 29º- 4), não estava regulamentada a avaliação dos membros das direcções executivas que não exercem funções lectivas (Artigo 31º- 1), não estavam aprovados os modelos de ficha de avaliação (artigo 35º);
3.3 As escolas dispunham de 20 dias úteis para aprovar os instrumentos de registo (Artigo 6º) e os indicadores de medida previamente estabelecidos (sublinhado nosso) pela escola (…) quanto ao progresso dos resultados escolares esperados para os alunos e a redução das taxas de abandono escolar tendo em conta o contexto socioeducativo (Artigo 8º, 1 – b);
3.4 Previamente, era necessário adequar à nova situação o Projecto Educativo, o Plano Anual de Actividades e o Regulamento Interno, definir o conceito de abandono escolar no ensino secundário, estabelecer o contexto socioeducativo (últimos dados do IGE são de 2004 -2005), tudo isto em simultâneo com o normal funcionamento da escola;
3.5 Por sugestão da DGRHE (Informação nº B08020359N, de 24/01/2008), surgiu a informação de que os prazos processuais previstos no art. 34 do DR nº 2/2008 são contados a partir do dia útil imediatamente a seguinte ao da divulgação das orientações do CCAP;
3.6 A 25 de Janeiro, foram publicadas recomendações gerais assinadas, a título pessoal, pela Presidente do CCAP (ainda não constituído);
3.7 Na mesma data, foram publicadas as fichas de avaliação do desempenho (nem todas; até hoje ainda não foram publicadas as relativas à avaliação dos avaliadores);
3.8 Foi publicado o Decreto Regulamentar 4/2008 de 5 de Fevereiro, que define a composição e o modo de funcionamento do Conselho Científico para a Avaliação de Professores - CCAP - (Artigo 6º, 2 do Dec. Reg. 2/2008) e do qual transcrevemos o artigo 12º- O CCAP deve estar constituído no prazo máximo de 60 dias a contar da data de publicação do presente decreto regulamentar. (Se acaso fosse possível implementar o processo nos moldes e prazos que o ME preconiza, não percebemos qual seria a necessidade da constituição deste órgão que só poderia fornecer indicações a posteriori);
3.9 A 13 de Fevereiro, foi publicada, em papel não timbrado e sem assinatura, uma nota de alteração de prazos que atribui às escolas a responsabilidade de gerir os prazos intermédios, desde que, entre outras exigências, os professores contratados sejam avaliados no presente ano lectivo (para avaliar os professores contratados não é necessário proceder à elaboração de instrumentos de registo, indicadores de medida, etc.?);
3.10 A 26 de Fevereiro, foi divulgado, no site da DGRHE, o despacho de delegação de competências, ainda não publicado em Diário da República, que prevê, por exemplo, que quando os docentes avaliadores se encontrem em observação de aulas sejam substituídos por outros do mesmo grupo de recrutamento, por forma a que não se verifique qualquer prejuízo para os alunos e se mantenha em funcionamento a unidade do grupo/turma. (Se um avaliador tiver que avaliar 10 colegas, poderá ter de ser substituído em 30 aulas, num só ano lectivo, o que corresponde, em algumas disciplinas, a um terço do total de aulas previstas na planificação anual);
3.11 Na mesma data, a DGRHE publicou dois textos, nenhum assinado – Duas notas de leitura temática, uma relativa à constituição, competências, etc. da Comissão de Coordenação da Avaliação do Desempenho (primeiro passo para a implementação do modelo) e outra relativa aos impedimentos da CCAD/Avaliadores;
3.12 Nessa mesma data, foi publicado um texto de apoio da autoria de duas professoras da Universidade de Lisboa – Algumas considerações a propósito da avaliação do desempenho dos professores;
3.13 Ainda na mesma data, foi publicada a Circular nº B080002111G que, além de reafirmar a obrigatoriedade de proceder à avaliação dos professores contratados até final do presente ano lectivo, acrescenta que também têm que ser avaliados aqueles que, para efeitos de progressão na carreira, carecem de conclusão do processo de avaliação;
3.14 Finalmente:
Quando estará estabilizada a produção e envio à escola da documentação relativa à avaliação?
Como pode este Decreto-Regulamentar (pp. 226) ‘promover e premiar o mérito e valorizar a actividade lectiva […] para a dignificação da profissão docente e para a promoção da auto-estima e motivação dos professores’?

4. A nossa escola não tem condições para implementar este modelo no presente ano lectivo.
4.1 Somos uma Escola Secundária com tradição de empenhamento e rigor e orgulhamo-nos de fazer bem o nosso trabalho;
4.2 Temos alunos dos 10º, 11º e 12º anos (muitos dos quais serão submetidos a avaliação externa); aplicamos as provas intermédias de Biologia e Zoologia, Física e Química e Matemática; fazemos periodicamente exames para estrangeiros;
4.3 Apesar de considerarmos que não estavam criadas todas as condições para o fazermos, começámos a trabalhar para a implementação do Dec. Reg. 2/2008 imediatamente após a sua publicação. Esse trabalho tem exigido muitas horas de trabalho extraordinário e continuado, colidindo já seriamente com o nosso trabalho da componente individual (preparação de aulas, elaboração e correcção de testes,…);
4.4 Temos muito trabalho feito, mas estamos longe de ter tudo pronto para se iniciar o processo;
4.5 A pouco mais de uma semana do final do 2º período, teremos que dar, de forma serena, prioridade absoluta e, portanto, exclusiva à avaliação dos nossos alunos, pelo que não poderemos continuar a trabalhar em instrumentos de registo, etc., de modo a proceder à avaliação dos professores a que se refere a supra citada Circular nº B080002111G;
4.6 Mesmo que pudéssemos fazê-lo, que sentido faria avaliá-los no 3º período apenas?
4.7 Sabemos que há escolas, como a Senhora Ministra da Educação salienta, que têm o processo adiantado, mas só encontramos uma explicação possível para tal facto – terem iniciado o trabalho ANTES da publicação da lei; aliás, temos conhecimento directo de documentos datados de Outubro, o que, no mínimo, é insólito, dado que o normativo em questão apenas foi publicado em Janeiro!
4.8 Não pode o Conselho Pedagógico continuar a estar permanentemente reunido, já que os seus membros tanto internos como externos não podem eximir-se às funções e cargos que desempenham.

5. Sugerimos que:
5.1 O Dec. Reg. 2/2008 seja suspenso para que possam ser modificados os seus aspectos mais controversos, de modo a restituir às escolas a serenidade indispensável à promoção do sucesso educativo;
5.2 O presente ano lectivo seja considerado o ano zero da implementação do referido decreto;
5.3 O ME cumpra a sua parte e regulamente todos os aspectos que deveriam ser anteriores ao início do processo nas escolas, a fim de que o próximo ano lectivo se possa iniciar sem sobressaltos;
5.4 Os professores a que se refere a Circular nº B080002111G sejam tratados nos termos da legislação anterior à publicação do Dec. Reg. 2/2008.



Escola Secundária Pluricurricular de Santa Maria Maior, 5 de Março de 2008



A Presidente do Conselho Pedagógico

Maria Manuela Coruche Malhado

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