sexta-feira, 4 de abril de 2008

Dez Teses para compreender o que se (não) passa

1. A mudança não se decreta (Crozier demonstrou-o já na década de 60). Que ilações temos então de tirar?

2. A racionalidade é limitada (Herbert Simon dixit, há já muito tempo). Impossível prever todas as situações e problemas e decretar a solução universal. Neste último ano há numerosas evidências da ignorância e da persistência deste mito.

3. A realidade é complexa, heterogénea, caótica. Logo, as soluções de tamanho único são um desastre. J Formosinho demonstrou-o há mais de 20 anos.

4. A mudança é um processo errático, não linear e que tem de considerar as razões, os sentimentos e as emoções. Quer quando se pensa e decide ao nível macro, como ao nível micro.

5. A realidade é (em certa medida) o que pensamos dela. Dizem os poetas, com destaque para Fernando Pessoa. Mas isto tem implicações que podem ser catastróficas: a cegueira, a surdez, a temosia e a obsessão podem levar-nos ao abismo.

6. A escola (o modelo escolar) herdou toda uma 'tecnologia' da 1ª revolução industrial. A sua gramática (na organização dos saberes, na gestão dos espaços e dos tempos, na constituição de turmas e de turnos) mantém-se inalterada. Parte da sua ineficácia reside neste desfasamento. O que temos vindo a fazer é remendar um pano sem conserto.

7. Do professor tecem-se as mais desencontradas percepções: desde o manga de alpaca cuja principal missão é guardar as crianças (e este foi um erro capital que se materializou em diversas medidas e foi - o que é mais grave - geralmente aceite), até ao profissional que sabe o que faz, por que o faz e que preza a sua autonomia, a sua capacidade de decisão, e que não está sempre à espera que o ME lhe diga o que tem de fazer. O que pode ser grave (se esta hipótese for credível) é que os mangas de alpaca cresçam.

8. A desconfiança é a matriz da acção pessoal e organizacional. Por muitas razões (e sentimentos). Porque a escola é o lugar dos desencontros, porque a intriga e a inveja, porque o medo do outro destruir a auto-estima. E no fundo porque o modelo escolar sempre separou as pessoas, sempre as desencontrou para melhor as dominar. E sem espaços e tempos para o encontro não é possível construir lentamente a confiança.

9. A autonomia vem sendo uma ficção. Ninguém a quer. O ME porque se mantém refém da ideia de que o Diário da República (ou mesmos os comunicados sem data e assinatura, ou até os memorandos das reuniões) é o regulador por excelência da acção educativa. E pensa que o poder está aí. Não está. As escolas e os professores (enuncio uma tese geral, sabendo que há excepções) também preferem a vida nesta ilusão. O ME que decida, que mande. Nós cumprimos. Se os resultados forem maus a responsabilidade é de quem decidiu. Nesta Babel, neste jogo de faz de conta, neste labirinto todos perdemos, todos nos enganamos. O medo de existir, de errar, de aprender com o erro. O medo da liberdade. A ilusão da igualdade.

10. A demissão geral da sociedade em torno da exigência educativa. Todos se demitem: os pais depositam os filhos na escola; os empregadores continuam a preferir a mão de obra barata; o próprio Estado não recruta os jovens diplomados por causa do défice e de uma vaga ideia que o mercado é salvação universal. O saber não tem valor. Bastam os diplomas.


Post roubado ao Blog terrear, de José Matias Alves

1 comentário:

Anónimo disse...

Aqui está um tema que poderia merecer uma reflexão mais cuidada por parte dos professores. Um estudo feito pelo Banco Europeu de Investimentos,sendo seus autores Luísa Ferreira e Pedro Lima, um pequeno excertO:
“Embora a análise reconheça incapacidade para “atrair os professores mais aptos”, denuncia o facto de haver muitos docentes que não estão a leccionar, registando-se uma elevada percentagem de professores sem qualificações “apropriadas”.

Em salário, os docentes portugueses do básico com 15 anos de experiência ganham o mesmo que os congéneres espanhóis ou franceses, “todos eles com melhor desempenho”. “A situação dos professores não se distingue significativamente da maioria dos países desenvolvidos”, com Portugal a ocupar a quinta posição na OCDE, com o salário de topo dos professores do básico.

Os autores lembram “a pouca atenção prestada à formação dos professores”, ao seu processo de formação, entrada na profissão e exercício. E concluem que continuamos com poucos alunos no ensino e com resultados que deixam “bastante a desejar”. Aconselham mais autonomia para as escolas, mais qualidade no ensino dos professores e melhor uso dos recursos financeiros.
Além de não ganharem mal, os professores portugueses têm menos alunos por turma, apesar de as crianças passarem “mais horas” nas salas de aula do que em países onde obtêm melhores resultados.”
Em detalhe aqui
http://cef-spf.org/imp_27.html